
Desde que se tornou Campeã Europeia Júnior em 2003 até hoje, já foi campeã de Espanha e da Europa 14 vezes, além de outros títulos e classificações. Desde então, não parou de treinar diariamente como se estivesse numa competição constante, sempre com a mesma motivação do primeiro dia, quando o seu pai a introduziu neste desporto aos 8 anos. A ele deve a sua paixão e todos os valores que lhe transmitiu, não só no kitesurf, mas também na vida.
Aqui está uma entrevista que nos concedeu após o seu regresso do Panamá, para que possas conhecê-la melhor. Se queres seguir os seus passos, consulta esta lista de centros onde aprender kitesurf em Espanha.

Yumping.- Com apenas 21 anos, já foste campeã mundial várias vezes, campeã de Espanha três vezes e até tens um Recorde do Guinness por seres a campeã mais jovem do mundo. Não sentes um certo vértigo ao olhar para trás?
Gisela Pulido.- É verdade que conquistei vários títulos mundiais e alguns recordes, mas não penso nisso todos os dias. O meu pai diz-me sempre que o que já tenho é meu e ninguém mo vai tirar. Por isso, é importante pensar no futuro, nas metas que ainda quero alcançar. Temos de continuar a melhorar, a progredir e a esforçar-nos ao máximo todos os dias :)
Y.- Em 2003, com apenas 9 anos, tornaste-te Campeã Europeia Júnior, o teu primeiro título competitivo. O que recordas da primeira vez que subiste a um pódio?
G.P.- A primeira vez que subi a um pódio foi aos 6 anos, quando competia em natação, antes do kitesurf. Foi a melhor sensação do mundo, estar entre as três primeiras. E torna-se viciante. Treinamos para nós mesmos e para ficarmos satisfeitos com o nosso desempenho, mas os resultados são fundamentais.

Medir-nos com os outros, competir e ver quem é o melhor. É a maior recompensa que podemos ter!
Y.- Dizem que herdaste o gosto pela adrenalina do teu pai. O que aprendeste com ele?
G.P.- Aprendi muitas coisas com o meu pai, claro, como a paixão pelos desportos que pratico hoje. Com apenas 1 ano levou-me à piscina, aos 3 anos a andar de bicicleta sem rodinhas, aos 5 a fazer snowboard e surf, aos 6 windsurf e, finalmente, aos 8, kitesurf... Mas não só os desportos, também os valores que me transmitiu ao longo dos anos. Ele é a minha referência em tudo.

Y.- Apesar do seu apoio incondicional, os inícios foram difíceis?
G.P.- Claro que todos os inícios são duros. No meu caso, comecei muito cedo. O meu pai deixou a sua vida e o trabalho em Barcelona para nos mudarmos para Tarifa e podermos ser profissionais neste desporto. Foi uma aposta arriscada que podia ter falhado a qualquer momento. Por isso, o meu pai era muito rigoroso e exigente comigo. Eu entendia perfeitamente, mas quem via de fora talvez não.
Estou feliz por ele ter sido duro comigo, porque ajudou-me a ser quem sou hoje. Talvez o mais difícil tenha sido estar longe da minha mãe, embora agora ela viva em Tarifa e a possa ver com mais frequência.

Y.- Desde o teu primeiro título até agora, não houve um único ano em que não tenhas sido campeã ou ficado entre as três primeiras. O mundo da competição é muito duro?
G.P.- Claro que a competição é dura. Quando era pequena, não tinha noção do que significava, era uma criança e não percebia. Mas, à medida que cresces, consegues patrocínios, a imprensa fala de ti e começas a sentir os nervos.
O nível técnico das mulheres também está a crescer, é mais difícil estar entre as melhores e tens de manter a motivação como no primeiro dia, com a mesma vontade de treinar... Mas, como disse, a recompensa é enorme. Poder dedicar-me ao que mais gosto, a minha paixão. Ou quando saio da água e dizem que ganhei... Só por isso, vale a pena!

Y.- Como conseguiste conciliar os treinos e competições com os estudos?
G.P.- Fiz o ensino secundário presencialmente num instituto em Tarifa. Consegui conciliar com a ajuda dos meus colegas e professores, que me facilitavam. Mas o secundário tive de fazer à distância porque viajava muito. Agora estou a estudar marketing numa universidade em Madrid, a Utad, e é um pouco complicado com tantos treinos e viagens, mas se fores disciplinado, consegues conciliar tudo. Além disso, se gostares do que estudas, é ainda mais fácil :)

Y.- Desde muito nova, devido à falta de competições deste tipo, tiveste de viajar muito pelo mundo. Alguma vez sentiste falta de ter "uma vida normal"?
G.P.- Nunca senti falta disso, pelo contrário, estou feliz e grata pela vida que tenho. Ter a oportunidade de viajar pelo mundo, estar em contacto com a natureza, conhecer lugares incríveis, pessoas novas, fazer amigos, competir no que mais gosto... O que mais posso querer?

Y.- O que é o kitesurf para ti?
G.P.- É tudo. É no único em que penso quando acordo de manhã! Olho pela janela para ver se há vento e se posso ir treinar... É o que me faz feliz...
Y.- Praticaste e competiste em muitos lugares: Quénia, Austrália, Marrocos, Nova Caledónia, Chile e, claro, Tarifa, a meca do kitesurf. Qual foi o destino mais mágico para ti?
G.P.- O meu lugar favorito para praticar kitesurf é o norte do Brasil. As condições lá são as melhores do mundo. Tem lagoas imensas com água plana, vento constante, calor, sol... Além disso, gosto da cultura, das pessoas, da comida... Sinto-me muito à vontade lá.

Y.- O que te levou a mudar para a modalidade de freestyle?
G.P.- O freestyle consiste em fazer manobras, e desde pequena era o que mais gostava e achava mais divertido. Também pela criatividade e liberdade de fazeres o que queres e como queres. É incrível!
Y.- Em 2014, a polaca Karolina Winkowska ficou com o pódio depois de os juízes anularem a tua vitória (com a polémica que isso gerou). Como lidas com contratempos que não dependem de ti?
G.P.- No momento, é muito duro, porque, como disseste, não depende de nós. Mas, por isso mesmo, não podemos fazer nada. Temos de seguir em frente e não ficar a pensar no que aconteceu.

Fiz o meu trabalho, treinei como nunca, competi muito bem e dei tudo na água.
Y.- Como é o dia a dia da Gisela Pulido?
G.P.- Costumo acordar cedo, tomar o pequeno-almoço e ir ao ginásio durante duas a três horas. Quando volto, descanso um pouco e aproveito para estudar. Depois do almoço, se as condições forem boas, vou treinar na água. Se não houver vento, vou ao ginásio outra vez à tarde. Depois, dormir...

Mas no inverno faz muito frio em Tarifa, por isso vou para outros sítios para treinar com calor. Agora estive no Panamá. Mantenho a mesma rotina, só que noutro lugar.
Y.- No kitesurf, há alguém que admires e queiras imitar?
G.P.- A minha referência no kitesurf sempre foi Aaron Hadlow, campeão mundial várias vezes. Para mim, a nível técnico, é o melhor. Por isso, tento sempre aprender com ele, como faz as manobras e como treina.

Y.- Praticas outros desportos de aventura no teu tempo livre?
G.P.- Não costumo praticar muitos desportos além do kitesurf, para evitar lesões. Quando posso, às vezes faço surf, mas nada mais. Só ginásio, correr e bicicleta.
Y.- Em que consiste o treino de uma kitesurfista de competição como tu?
G.P.- A parte física faço no ginásio. Todos os exercícios são funcionais, com o meu próprio peso. Também faço cardio, cerca de 5 horas por semana, para ter boa resistência.

Na água, divide-se em várias fases: aprender novas manobras, treinar as que já sei para ganhar consistência e praticar como se estivesse nos 7 minutos de competição.
Y.- Alguma vez pensaste em desistir?
G.P.- Em 2012, fiquei em 3º lugar no Mundial. Quando acabou a última prova, pensei que não queria competir mais. Disse ao meu pai que me ia retirar. Mas no dia seguinte, quando estava a voltar para Espanha, disse-lhe: "Bem, temos de nos esforçar e continuar a treinar, não é?" E foi isso que fiz. Quando cheguei a casa, descansei um pouco, mas depois comecei a treinar a sério para recuperar o título em 2013.
Y.- Se voltasses a nascer, dedicar-te-ias ao kitesurf?
G.P.- Nunca pensei nisso, mas acho que sim. Se me tivessem ensinado o desporto, provavelmente estaria a competir em kitesurf. E se não, estaria a praticar outro desporto e provavelmente a competir, porque é o que mais gosto!

Y.- Que conselho darias a quem quer começar no kitesurf?
G.P.- O mais importante é ir a uma escola especializada e aprender corretamente. As noções básicas do desporto, como funciona, conhecer o vento e as condições... Depois, comprar um bom equipamento para disfrutar na água. O kitesurf é viciante, por isso, se vives longe do mar, podes sofrer um pouco :P
Y.- Onde te vês daqui a 10 anos?
G.P.- Nunca pensei nisso, daqui a 10 anos terei 31... Que velha! Não quero pensar onde estarei, por agora quero continuar na elite deste desporto o máximo de tempo possível, desde que o meu corpo aguente as lesões e a minha mente esteja preparada para dar tudo.

Y.- Abriste a tua própria escola de kitesurf. Qual é o teu principal objetivo?
G.P.- Em 2009, abrimos o primeiro Gisela Pulido Pro Center, em Tarifa, a cidade onde vivo. O kitesurf é a minha paixão, por isso abri a escola, para ensinar o meu desporto a quem quiser. O meu objetivo é ter mais escolas pelo mundo e ajudar a crescer o desporto para que cada vez mais pessoas disfrutem na água.
Y.- Qual é o teu lema?
G.P.- Tenho muitos lemas, é difícil escolher um! Vive cada dia como se fosse o último. Viaja pelo mundo, relaciona-te com as pessoas e faz muitos amigos. Sê feliz e sorri todos os dias. Define objetivos na vida e luta por eles. E faz sempre tudo a 100%, porque queres mesmo e ninguém te obriga. Acredita em ti, porque se tu não acreditares, ninguém acreditará. Chega? :D
