
Antigamente pensava-se que o Aconcágua poderia ser um vulcão, já que as suas rocas o denunciavam com alguma origem vulcânica, no entanto demonstrou-se não possuir nenhum tipo de cratera e deduziu-se o contrário.
É uma montanha muito frequentada por alpinistas e aventureiros de todas as partes do mundo em busca de desportos extremos, já que possui vastas rotas de diferentes dificuldades e uma beleza imensa. No período de dezembro a março, recebe mais de 6.000 visitas de curiosos pelas suas maravilhosas paisagens e pelas experiências de montanha que oferece.
De forma bipolar, o Aconcágua oferece um caminho simples e outro de alta dificuldade:
- Considerada como a sua "rota normal" e a mais frequentada, a sua Face Norte situa-se a noroeste da montanha e proporciona uma ascensão tecnicamente fácil sem passagens de escalada, mas com fortes efeitos de pressão atmosférica.
- A Face Sul é muito mais arriscada e apresenta um alto grau de dificuldade, já que possui uma grande parede de gelo com 3.000 metros de altura. Não é monitorizada pela patrulha de resgate devido à sua alta dificuldade e ao risco de desmoronamentos e avalanches que apresenta.

Excerto da entrevista a Héctor Ponce de León para Yumping México, a seguir apresentamos o fascinante relato do alpinista mexicano Héctor Ponce de León numa das ascensões mais difíceis da sua vida nesta Parede Sul do Aconcágua:
Yumping México- Há algum momento excepcional durante uma ascensão que te tenha marcado para o resto da vida?
Héctor P.L.- Pois sim, repito-me a uma ascensão que acabei de contar, mas um dos momentos que mais recordo pela intensidade e pelas situações do lugar onde estávamos é na Parede Sul do Aconcágua.
Esta parede encontra-se classificada no livro As Grandes Paredes com outras nove paredes, então é considerada uma das dez paredes mais difíceis do mundo.
Nela, novamente Andrés Delgado e eu propusemo-nos a fazer uma ascensão em estilo alpino, aclimatámo-nos por outra rota e fomos para o lado Sul da montanha e começámos a escalar e novamente volto a mencionar que para fazer tantos metros de parede neste estilo, tens de praticar escalada muito rápida e ir muito leve para conseguir a velocidade que te permita em 3 dias escalar 3.000 metros.
Isto implica que levas realmente pouco equipamento, vais com o indispensável e unicamente. Por exemplo, Andrés e eu levámos apenas uma corda de 50 metros, uns poucos pitões. Menciono-te isto porque neste tipo de ascensão existe o que eu chamo -o ponto de não retorno- e é que sabes que quando escalares os próximos 20 metros já não há volta atrás, já vais ter de fazer cume para conseguires descer do outro lado da montanha, ou seja, já não tens equipamento suficiente para recuar. E bem, estes são momentos incrivelmente intensos como podes imaginar.
O que nós nos propusemos nesta Face Sul do Aconcágua, era fazer toda a parede em 3 dias. O plano resultou exitoso nos primeiros dois dias. Chegámos na tarde/noite do segundo dia a onde nos tínhamos proposto chegar, a uma altura de 5.900 metros. Faltavam-nos uns 1.000 metros de escalada para fazer cume no dia seguinte por esta parede de neve gelo que precisamente se conhece como a Rampa Messner.
Naquela última noite, nevou muito, veio mau tempo e fechou-se. E bem, no dia seguinte não conseguimos começar a escalar à hora que tínhamos pensado. Queríamos começar às 6 da manhã para fazer cume pela tarde e começar a descida pelo outro lado. Mas não conseguimos porque havia muita neve e caíam pequenas avalanches que nos teriam arrastado. E finalmente não conseguimos começar a escalar até às 15 horas. Apesar de tentarmos ir à maior velocidade possível, deram as 21 horas e ainda faltavam 600 metros para o cume. Não tínhamos comida, tínhamos abandonado a tenda que tínhamos para tentar aliviar-nos! Pois... Escureceu e estávamos a meio de uma parede de gelo... Já sem comida, sem água, nada. Ficámos pendurados na parede sem sacos-cama obviamente, sem sequer casacos de penas, apenas com o básico com que íamos escalar.
Na manhã seguinte quando finalmente saiu o sol, podes imaginar o estado em que estávamos de frio, doloridos de estar sentados no arnês... E a verdade é que não víamos como íamos escalar esses últimos 600 metros de gelo que pareciam muito difíceis, muito duros. E apercebemo-nos de que realmente a corda já não nos servia para nada... Estávamos tão cansados que só precisávamos subir aquela parede rápido e por mais arriscado que fosse fazê-lo sem a corda... pois já não fazia sentido, era a única maneira. E lembro-me perfeitamente daquele momento de decisão de nos soltarmos e deixar cair a corda por aquela parede e vê-la cair...
O Andrés, que sempre teve uma determinação e uma forte decisão, foi o primeiro dos dois a começar a escalar. Tirou o mosquetão e começou a mover-se no gelo que parecia duríssimo. Eu via que lhe custava, os crampons mal mordiam o gelo que brilhava de tão duro. E a verdade é que vê-lo avançar, ele que era tão bom escalador, tão lentamente e com tanto esforço, invadiu-me um medo fortíssimo. Pensei que não conseguiria fazê-lo e a verdade é que me levou uns 20 minutos...
Finalmente enchi-me de coragem e tirei os mosquetões, peguei no martelo e comecei a mover-me. Os primeiros metros daquele gelo por onde antes tinha passado o Andrés, foram talvez os momentos mais assustadores que alguma vez tive na montanha. Batia com o piolet e o gelo fazia ricochete e não conseguia que ficasse. Virava para baixo e via abaixo de mim, 2 mil e tal metros de queda e...
Aconteceu algo incrível. De repente apercebi-me de que já não tinha nada a perder. De estar totalmente aterrorizado, quase imobilizado de medo, num instante acalmei-me, comecei a respirar e comecei a mover-me com muita fluidez, com muita soltura. De repente o meu piolet começou a entrar, os meus crampons começaram a penetrar no gelo e entrei num estado fabuloso. Movia-me com muita fluidez, todo o meu universo reduziu-se aos poucos metros quadrados de gelo que tinha à minha frente. Esqueci-me de onde estava e de onde vinha. Tudo o que eu era, era movimento sobre o gelo. Esta foi realmente uma experiência que talvez possa soar um pouco exagerada, mas foi quase mística no sentido de que era como se alguém mais estivesse a escalar por mim e eu apenas estivesse a desfrutar do passeio. E inclusive num momento dado entrei como que... como em transe, é que não encontro outra palavra para descrevê-lo. E quando me apercebi, a parede tinha terminado e senti até uma desilusão. Enquanto durou aquele muro, foram um par de horas em que a situação me levou a um estado de consciência incrível de não ter nenhum pensamento, nenhuma preocupação. Foi apenas ser alguém que estava a escalar.
A verdade é que foi um momento muito intenso, muito belo e curiosamente veio depois de um momento aterrorizante. Este posso dizer-te que é um dos momentos que mais me marcou, mais memorável, mais intenso e mais revelador a muitos níveis.